Volta completa em Ilha Grande (dia 5): De Parnaioca até Palmas

Lugares de ruínas históricas engolidas pela natureza da ilha


No quinto dia aconteceria o retorno à civilização, ou seja, eu chegaria em locais com ligação à Vila de Abraão, como Dois Rios e Palmas, só que eu não esperava encontrar tantos vestígios de ruínas do passado histórico da ilha. E tudo vem acompanhado de praias e natureza selvagem. Para isso, levantei acampamento e continuei o rumo bem cedo.

Foi a última noite que eu estaria acampado em Ilha Grande (na próxima haveria um hostel)


PARNAIOCA

Antes de ir embora de Parnaioca, passei para visitar a cachoeira que fica bem perto da praia. O caminho passa por trás da igrejinha e do cemitério, em direção ao rio, dá a volta por uma casinha velha e termina na beira do Rio Parnaioca. É uma piscina natural formada por uma pequena queda d´água, um lugar bem zen.

A trilha da cachoeira passa por trás da igreja e do cemitério


Antiga árvore lenhosa


Piscina natural da cachoeira do Rio Parnaioca


TRILHA PARA DOIS RIOS

A trilha de Parnaioca para a vila de Dois Rios é a mais longa dos circuitos da Ilha Grande, com aproximadamente 7 km de extensão. Ela inicia no caminho por trás da casa da Janete e termina do lado esquerdo das ruínas do presídio de Dois Rios. Eu já estava caminhando há bastante tempo quando vi uma pedra incomum, como feita pelo homem. Me aproximei e vi que era a base de uma ponte que existia ali, foi então que olhei em volta e percebi que aquela trilha era na verdade uma antiga estrada, hoje descaracterizada pela vegetação cerrada. Naquelas terras foi cultivado café na época do Brasil colonial e a estrada deveria ligar engenhos até então existentes.

A trilha passa por uma área bem pedregosa e por antigas estradas


O caminho beira o mar, poucas vezes visto devido à vegetação fechada


Na beira dessa antiga estrada, existe até hoje uma grande árvore de jequitibá que provavelmente era um local de descanso de quem passava por ali. A trilha passa também por imensas pedras e grutas, como a Toca das Cinzas, local em que os escravos que roubavam eram mantidos presos até a morte. A toca é identificada por uma placa.

Um antigo e alto jequitibá


Pedras gigantes são vistas entre a vegetação


Ponte de alvenaria já nas proximidades de Dois Rios


DOIS RIOS

Depois de mais de 3 horas de caminhada, enfim a chegada na sede do antigo presídio que foi um dos mais importantes do Brasil. As ruas e casas foram planejadas e dá para perceber que era um lugar bem bonito no passado. Atualmente, existe um Campus da UERJ de estudos ambientais e os funcionários ocupam as antigas casas dos funcionários do presídio, mas tudo está em péssimo estado de conservação. Tentei achar um prato feito barato pois já era hora de almoço. Algumas pessoas vendem quentinha (ilegalmente) na praia, mas como o vendedor tentou me enrolar e vender mais caro (R$ 25), voltei para a rua principal no Bar da Dona Tereza, uma senhora simpática e faz PF por R$ 20 e tem um lugar bem agradável para comer debaixo das árvores.

Havia apenas um vendedor de refeição na praia, mas não fui com a cara dele


Dois Rios no passado era uma fazenda e no início do século 20 foi construído um presídio que chegou a receber presos políticos durante a Segunda Guerra. Mais tarde foi usado no governo de Getúlio Vargas e depois no regime militar para concentrar presos políticos comunistas. Foi no final dos anos 50, que os presos comuns também foram instalados no presídio com a demolição do Lazareto. Dessa união de comunistas e bandidos comuns que surgiu o Comando Vermelho (por causa da cor comunista) que, segundo algumas pesquisas, foi um projeto patrocinado pela própria União Soviética para criar uma força revolucionária e implantar o comunismo no Brasil. O plano fracassou pela ambição dos traficantes e hoje é um problema de segurança pública... mas são histórias que nunca serão contadas nas escolas.

O presídio de Dois Rios é hoje um museu


O presídio estava fechado por falta de recursos financeiros. A minha sorte é que eu já visitei antes


Estava aberto à visitação apenas o Museu do Meio Ambiente, um anexo das instalações do presídio


Maquinário antigo em meio às ruínas deste casarão que fazia parte da fazenda colonial de Dois Rios


CAXADAÇO

Já de barriga cheia, por volta das 13h00, teve início a caminhada para outra praia que é considerada uma das mais bonitas da ilha. Para achar a trilha, basta seguir na estrada das palmeiras que vai para Abraão por 500 metros depois da saída de Dois Rios. A entrada à direita é sinalizada com uma placa informativa da trilha para Caxadaço.

Estrada Dois Rios x Abraão


Imponentes palmeiras cercam o caminho


A trilha para Caxadaço tem 2,7 km e passa em caminhos de pedras construídos pelos escravos que chegavam pela praia. A praia é completamente cercada por pedras, permanecendo escondida da vista de embarcações no mar, por isso, foi utilizada para desembarque de escravos traficados após a abolição da escravatura.

Algumas placas foram colocadas pelo caminho para indicar a direção correta


Calçamento de um antigo caminho de desembarque de escravos


A trilha possui algumas bifurcações que seguem para pesqueiros, mas em todas eu vi placas indicando o caminho certo. Resumindo: a trilha segue predominantemente pela esquerda das bifurcações. A praia é deserta, sem casas, e com uma faixa de areia de apenas 15 metros. 

Depois de uma descida íngreme, a chegada na praia é entre pedras


Pequeno paraíso com águas transparentes e calmas


Algumas escunas param em Caxadaço trazendo turistas desde Abraão


TRILHA PARA SANTO ANTONIO 

De Caxadaço em diante, para cruzar até Santo Antônio/Lopes Mendes, não existe trilha oficial demarcada. A trilha é bem fechada, pouco usada, sem sinalização, a mais difícil de todas da ilha para visualização, sendo inclusive não recomendada pelos órgãos de turismo a ser feita sem guia. Eu levei um GPS com o percurso (não estava com precisão, mas dava para saber a direção geral), e vou tentar descrever e dar algumas dicas sobre a trilha. Não achei tão difícil, mas requer atenção. Em primeiro lugar, ela inicia atrás da placa informativa da Trilha T15 (Caxadaço x Dois Rios). Depois de alguns passos, a trilha chega numa vala e segue na direção da subida próxima a ela. 

Local de início da trilha para Santo Antônio / Lopes Mendes atrás dessa placa


Achei o início mais complicado que o restante da trilha, mas se for feita com atenção e não seguir em frente quando não tiver a certeza de que aquilo realmente é uma trilha, não terá problemas. Havia uma árvore caída que confundiu e quase fez com que seguíssemos para a direção errada, mas percebi e voltei até o último ponto de certeza. Depois da subida, a trilha abre e começa uma descida num barranco onde tem uma corda colocada para ajudar. Daí pra frente, passa por vestígios de caminhos de pedra antigos, não tão fáceis de perceber, mas lembre-se: ficou na dúvida, volte até o último ponto que tinha certeza e observe melhor. Em alguns pontos existem fitas colocadas por trilheiros para indicar o caminho certo. São quase 3 km de trilha.

Descida num barranco com auxílio de corda


Cipós exóticos pelo caminho


Uma "escadaria" de pedras criada por escravos


Essa pedrinha estava atrapalhando, tive que remover!


A trilha fechada termina numa trilha de verdade, bem marcada. O lado esquerdo segue para Palmas e o lado direito vai até a descida para a Praia de Santo Antônio, por mais 300 m. A praia é cercada de pedras, possui areia fina e tem um riacho que deságua no mar, mas a água vem da área das pousadas no outro lado da ilha e não é recomendável beber. 

Vista do pôr do sol de cima da trilha da Praia de Santo Antônio


CHEGADA EM PALMAS

A trilha de retorno da Praia de Santo Antônio termina em outra trilha larga e fácil de andar, é a chamada T11 (Lopes Mendes x Pouso/Mangues). Deste ponto da bifurcação seriam mais 500 m para chegar em Lopes Mendes, que é considerada a melhor praia da Ilha Grande, mas como já havia escurecido e eu já conhecia Lopes Mendes, segui a direção da Enseada de Palmas. Aquela enseada foi bem movimentada no século 19, pois havia uma fazenda de cultivo de cana de açúcar e café. Hoje só possui cerca de 70 moradores.

As trilhas dessa região são bastante frequentadas e, por isso, bem marcadas


O caminho passa pela Praia do Pouso (onde os barcos de Abraão para Lopes Mendes atracam) e a Praia de Mangues (local de pousadas). Depois de atravessar por uma ponte sobre o mangue, começa uma trilha de subida íngreme que termina na Praia de Palmas, o que tinha de mais civilizado nos últimos dias.  Palmas é uma praia em que predomina os campings e uma opção barata para quem quer ficar perto de Abraão mas tem pouca grana. Fiquei no Camping Palmas, que também possui um quarto coletivo de hostel. Como o camping estava R$ 15 e o hostel R$ 20, fiquei no último mesmo. A chegada foi em torno de 20h30, depois de caminhar por 2 km desde a bifurcação da Praia de Santo Antônio.

Depois de jantar dois x-egg e batata frita, este foi o resultado de cinco dias de trilhas intensas zzz


O dia seguinte era o momento de chegar em Abraão e retornar para casa. No próximo post, falarei sobre o retorno, as lições aprendidas e o saldo geral de gastos.


MAPA

Mapa da Enseada de Palmas (clique para ampliar)


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Roteiro completo: ILHA GRANDE



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Sobre o autor

Sobre o autor
Renan é carioca, mochileiro, historiador e arqueólogo. Gosta de viajar, fazer trilhas, academia, ler sobre a história do mundo e os mistérios da arqueologia, sempre comparando os lados opostos de cada teoria. Cada viagem que faz é fruto de muito planejamento e busca conhecer o máximo de lugares possíveis no curto período que tem disponível. Acredita que a história foi e continua sendo distorcida para beneficiar alguns grupos, e somente explorando a verdade oculta no passado é que se consegue montar o quebra-cabeça do mundo.